segunda-feira, 6 de outubro de 2008

o Amor...


"Quero fazer o elogio do amor puro... "
Parece-me que ja ninguem se apaixona de verdade.
Ja ninguem quer viver um amor impossivel.
Ja ninguem aceita amar sem uma razao.
Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questao de pratica. Porque da jeito.
Porque sao colegas e estao ali mesmo ao lado.
Porque se dao bem e nao se chateiam muito. Porque faz sentido.
Porque e mais barato, por causa da casa.
Por causa da cama.
Por causa das cuecas e das calcas e das contas da lavandaria.
Hoje em dia as pessoas fazem contratos pre-nupciais, discutem tudo de antemao, fazem planos e a minima merdinha entram logo em "dialogo".
O amor passou a ser passivel de ser combinado.
Os amantes tornaram-se socios.
Reunem-se, discutem problemas, tomam decisoes.
O amor transformou-se numa variante psico-socio-bio-ecologica de camaradagem.
A paixao, que devia ser desmedida, e' na medida do possivel.
O amor tornou-se uma questao pratica.
O resultado e' que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade, ficam "praticamente" apaixonadas.
Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estupido, do amor doente, do unico amor verdadeiro que ha, estou farto de conversas, farto de compreensoes, farto de conveniencias de servico.
Nunca vi namorados tao embrutecidos, tao cobardes e tao comodistas como os de hoje.
Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, sao uma raca de telefoneiros e capangas de cantina, malta do "ta bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcancadores de compromissos, bananoides, borra-botas, matadores do romance, romanticidas. Odeio esta mania contemporanea por sopas e descanso.
Odeio os novos casalinhos.
Para onde quer que se olhe, ja nao se ve romance, gritaria, maluquice, facada, abracos, flores.
O amor fechou a loja.
Foi trespassada ao pessoal da pantufa e da serenidade. "

Miguel Esteves Cardoso in Expresso

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