quarta-feira, 30 de julho de 2008

S. Sebastião da Pedreira

É fácil simpatizar com Lisboa. Parece que, no Terramoto de 1755, várias igrejas ficaram destruídas. Mas a rua dos lupanares, ao que dizem os historiadores (que, aliás, deviam dar mais atenção aos lupanares), ficou intacta.

Nutro sincero fascínio por quem se orgulha do sítio em que nasceu. Pessoalmente, tenho dificuldade em orgulhar--me das coisas que me acontecem por casualidade e, como disse Fernando Pessoa, o lugar onde se nasce é o lugar onde mais por acaso se está. É certo que Pessoa bebia bastante, mas o conselho da prevenção rodoviária é «Se conduzir, não beba», e não «Se inventar aforismos sobre o sítio de que é natural, não beba.» Julgo que não é por acaso.

Não é que não haja motivos para uma pessoa se orgulhar de ser de Lisboa. À primeira vista, porém, parece que não há. Julgo que é unânime que a melhor coisa que Lisboa tem é a luz. No entanto, o modo particular como o sol brilha sobre uma cidade dificilmente será motivo de orgulho. Mais: se a luz é o melhor, quer dizer que aquilo que ela ilumina não é particularmente digno de nota. Por outro lado, contudo, é fácil simpatizar com Lisboa. Parece que, no Terramoto de 1755, várias igrejas ficaram destruídas. Mas a rua dos lupanares, ao que dizem os historiadores (que, aliás, deviam dar mais atenção aos lupanares), ficou intacta. Há que respeitar uma cidade em que isto acontece.

Mas, para mim, o principal motivo de orgulho de ser lisboeta é outro, e mais importante: se alguém disser mal de Lisboa, nenhum lisboeta se aborrece. Isto parece-me precioso. Se eu fizer um comentário negativo acerca de qualquer localidade portuguesa, no dia seguinte recebo centenas de cartas de cidadãos indignados. Não tenho o direito de dizer que determinada aldeia de Trás-os-Montes é atrasada. Há imprecisões infames nas minhas opiniões sobre o Carnaval de Torres Vedras. E a minha perspectiva sobre as vacas da ilha Terceira é um escândalo. Mas se eu fizer meia dúzia de críticas à cidade de Lisboa, mesmo que sejam injustas, o meu carteiro bem pode dormir até mais tarde, que ninguém se incomoda a escrever-me. É significativo. Não sei bem de quê, mas é.

Eu, como boa parte da população de Lisboa, nasci em S. Sebastião da Pedreira. Já lá passei duas ou três vezes e confesso que não senti grande coisa. Não me vieram as lágrimas aos olhos. Não me apeteceu escrever poemas. Não me incomoda que o resto do País desconheça onde fica S. Sebastião da Pedreira, quantos habitantes tem a freguesia, ou quais são as tradições locais, se é que há algumas. Trata-se de um sítio, e é tudo. O facto de eu lá ter nascido, como seria de esperar, não transformou a localidade num lugar especial. Assim é que é bonito. O sítio em que nasci é verdadeiramente banal. Não o trocava por nenhum outro.


Por: RIcardo Araújo Pereira



E eu que quando a grande maioria de Lisboetas também em S. Sebatião da Pedreira também concordo na íntegra com o RAP.
Eu própria já passei à porta do sítio onde nasci e de facto não senti nada de especial e concordo que ter nascido num sítio banal faz-me feliz, ah e não o trocava por nenhum outro.

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